sábado, 1 de outubro de 2011

Caminhos para os novos autores - Bate-papo com Tammy Luciano

Hoje trago uma entrevista muito rica e muito completa para quem quer entender melhor as dificuldades no caminho dos novos escritores. Considero a história de vida de Tammy Luciano (@tammyluciano) no meio literário muito interessante para aprendermos como, para se tornar um autor minimamente reconhecido, é necessário muito, mas muito trabalho - veja a postagem  Como se tornar um escritor?.
Tammy hoje participa de inúmeros eventos literários durante o ano, muitos como parte integrante do projeto @NovasLetras, em que alguns escritores se uniram para brigar por seu espaço no mercado. Mas suas conquistas vão muito além disso. Logo em seu início como escritora, neste caso com um trabalho mais jornalístico, ela lançou a biografia da Fernanda Vogel; livro que chegou a ter exposição no programa de Ana Maria Braga e que, como consequência, teve uma visibilidade muito grande, vendendo milhares de exemplares.

Após seu sucesso inicial, Tammy continuou com mais alguns trabalhos no meio literário e artístico até lançar o seu primeiro livro de ficção (Sou Toda Errada) em 2010. Novamente, a autora participou de muitos eventos, como a Bienal de São Paulo e a Feira do Livro de Porto Alegre. Com todo este esforço, o livro fez sucesso e conseguiu praticamente esgotar sua tiragem inicial, algo bem raro, em um período de mais ou menos um ano.


Enfim, acho que o que falei já basta como apresentação, até para demonstrar como é preciso se esforçar muito neste meio para conseguir se destacar - e a autora tem a completa noção disso, como demonstra em suas excelentes respostas durante a entrevista. Convido todos a lerem as coisas que ela disse; certamente, sendo um autor novo ou não, a experiência da autora trará lições importantes.


ENTREVISTA


Seu primeiro livro, a biografia da Fernanda Vogel, teve uma recepção muito boa pelo público e te lançou de vez no mercado literário. Como surgiu a oportunidade de escrever a biografia? Como você se preparou para lidar com um assunto tão delicado?
R: Eu já escrevia há muito tempo. Aliás, eu venho de uma estrada longa. Comecei fazendo teatro com 14 anos, passei minha adolescência estudando Artes Cênicas. Depois fiz faculdade de jornalismo e a partir desse momento atuar e escrever foram se misturando no meu cotidiano. Passei a escrever peças de teatro, poesias, crônicas e atuar bastante em teatro, fiz participações em novelas. Nunca pensei em escrever livros, achava o universo da livraria muito longe de mim, não tinha ideia como era vivenciar isso, conseguir publicar um livro... Confesso que se não fosse o destino, eu jamais teria virado autora de livros. Em 2001, na época do falecimento da Fernanda Vogel, escrevi uma crônica lamentando o acidente. A mãe dela leu o texto e pediu para me conhecer. Quando recebi o convite para escrever o livro sobre a Nanda, achei que não daria conta e cheguei a conversar com a Myrian sobre apresentar um amigo biógrafo, mas ela insistiu e eu resolvi abraçar o desafio. Jamais imaginei que aquele sim mudaria minha vida para sempre. Para escrever o livro, eu dei tudo de mim durante um ano e meio e busquei respeitar a imagem da Fernanda, escrevendo com o coração. Foi muito emocionante cada parte do processo do livro e como a Myrian Vogel diz: A missão do livro é transformar dor em amor. Acredito demais nisso.


Após o livro terminado, como você fez para encontrar uma editora? Pode nos contar quais estratégias utilizou?
R: Eu não tinha ideia de como proceder. Fizemos pelo meio mais honesto possível. Myrian me ajudou a fazer cópia do original e mandamos para várias editoras. Na época, eu fiz uma lista com mais de dez editoras. Quando a 7Letras ligou, eu achei que era trote. Pensei ser brincadeira de algum amigo. De todos os contatos que a gente recebeu, a 7Letras foi a que melhor se apresentou, topou fazer um livro com qualidade gráfica, com um acabamento lindo e por isso assinei o contrato com eles. Eu costumo dizer que o trabalho começa depois que o livro é lançado. Escrever, para quem quer ser escritor, acaba sendo o mais fácil, porque a luta do autor brasileiro é muito grande.


Conte-nos um pouco sobre como conseguiu que falassem sobre o livro no programa da Ana Maria Braga. Essa exposição abriu muitas portas?
R: Foi uma supresa enorme e tudo por acaso. Pelo que ficamos sabendo a Ana Maria Braga leu o livro, adorou e aí surgiu o convite. Foi impressionante o retorno. Depois que o livro apareceu no programa, a edição esgotou e saiu outra. A Ana foi muito querida, é uma mulher maravilhosa, recebeu a Myran Vogel de maneira muito gentil, sem explorar a imagem da Fernanda. A TV tem um alcance enorme e lamento que os livros não sejam ainda mais comentados. Acho que todo jornal, programa de TV deveria abrir espaço para a literatura, como fazem com o futebol, com as tramas das novelas... Falam pouco do universo das letras. Acho que por isso na internet a gente encontra tanta gente comentando sobre os livros que está lendo... É uma carência dos leitores. Já que não falam na TV, correm para falar na internet. Um amigo meu outro dia me disse algo engraçado: Cara, na internet você está muito famosa! (rs)  Tem muito blog bacana falando dos meus livros, só posso agradecer.

Após o sucesso com a biografia, você lançou um livro de ficção, o Sou Toda Errada, pode nos falar um pouco sobre essa empreitada? De onde surgiu a idéia para o livro? Fale um pouco sobre ele.
R: Na verdade, antes de Sou Toda Errada, eu lancei em 2005 Novela de Poemas que é uma coletânea das minhas poesias. Eu recebi um patrocínio de uma empresa querida, a Orient Mix, e eles me apoiaram em todo o lançamento, possibilitando a ideia do projeto que era pintar quadros em que tivessem trechos da minha poesia e junto saiu a publicação do livro que para minha surpresa, esgotou. Não que eu não acreditasse no projeto, mas muita gente me disse: Ninguém compra livro de poesia. Eu tenho certeza que compram, porque eu vendi! (rs) Tomei a decisão de não deixar sair uma segunda edição porque o Novela de Poemas é um livro muito íntimo, sou eu ali e me senti muito exposta, com minhas poesias sendo lidas. Ficção é melhor, a personagem não sou eu e é nesse gênero de literatura que eu quero trabalhar. Aí nasceu Sou Toda Errada que veio depois de um comentário de um amigo dizendo que tinha uma ex-namorada maluca. Achei que daria uma história interessante e inventei a Mila. Ela perde o namorado, não aceita não como resposta e passa a infernizar a vida do ex, fazendo tudo errado, sendo politicamente incorreta.


Com o lançamento de Sou toda errada, você participou de inúmeros eventos literários, como a Bienal e também discussões em lojas de grandes redes, como a Saraiva. Como isso foi possível?
R: Acho que isso é parte do meu ofício. Não posso escrever um livro, lançar e depois querer curtir uma piscina, achando que meu livro vai conseguir ser vendido sozinho. Meu trabalho precisa de mim, foi um compromisso que resolvi assumir e me apaixonar ainda mais pela minha profissão. As pessoas estão sabendo de mim agora, mas eu faço evento em livraria desde 2003. O processo do escritor é lento. Tem gente que me dá parabéns, sabe da minha batalha de anos e anos (http://www.tammyluciano.com.br/fotos.html), mas tem gente que me acha sortuda, pensa que consegui tudo esse ano. Não é assim. Amo essa chance de estar com meus livrinhos nas livrarias falando do meu trabalho, me aproximando do leitor. Ano passado, por exemplo, eu estava na Bienal de 2010 e uma leitora disse: "Tammy, eu te acompanho desde 2003". Cada encontro com cada leitor me importa. Eu não quero apenas vender o livro, quero saber o efeito do livro na vida da pessoa, então marco com leitores que já compraram o livro, para estarem comigo em outra livraria, quero saber o que sentiram lendo o livro. Já teve leitor chorando comigo porque se emocionou com a vida da Fernanda Vogel. Já teve gente reclamando da Mila e eu dou o maior apoio. Minha vilã (do livro Sou Toda Errada) é uma garota louca, difícil e sem caráter.
E qual foi a sensação de estar tão próxima de seu público nesses eventos? Fale um pouco de sua experiência.
R: Eu gosto de quebrar essa distância. Gosto de conhecer as pessoas, de escutar as histórias, de saber de que maneira meu trabalho está ali na vida de cada um. Eu não sou famosa, então as reações são tranquilas, o foco é o livro e eu não me sinto melhor que o leitor. Às vezes sinto que a pessoa está maravilhada com o encontro, mas eu faço questão de quebrar qualquer protocolo, não sou melhor que ninguém, venho de uma família de bem, que me ensinou a não me achar estrela, nem se algum dia eu estivesse em uma posição de destaque. A livraria é a chance de abraçar e agradecer o carinho das pessoas.

Agora sobre a dificuldade de colocar as obras na livraria. Você teve o apoio de uma boa editora, embora de porte médio, como foi esta questão da distribuição? Você, pessoalmente, correu também atrás dessa exposição nas livrarias?
R: Eu batalho muito. É um trabalho de formiguinha, mas eu tento não pensar nas dificuldades. Só penso em seguir, sem me abater. Já aconteceu de uma livraria na Barra da Tijuca receber meu livro, esgotar em pouquíssimos dias e eles não se interessarem em pedir novamente. Ou seja, existe muito mais do que a gente pode imaginar na batalha do autor. Se esgotou, por que não pedem imediatamente mais livros? Porque nem sempre é assim que funciona. E aí eu fui lá, pedi para gerente, peço para a minha editora ligar e não posso deixar de citar aqui o Bruno Borges que é meu parceiro de trabalho e está comigo ajudando e fazendo a assessoria do meu trabalho. Ele é incansável. E esse adjetivo é extremamente importante nesse trabalho. Meu livro passou a vender no Sul do país porque eu fui na Feira do Livro de Porto Alegre de 2010. É de conquista em conquista, degrau por degrau.

Como o público reagiu a este seu novo livro? Ele teve uma boa receptividade? As vendas foram boas? (nessa última pergunta, se quiser falar em números aproximados seria muito interessante, mas se não quiser, não há problemas)
R: Eu achei que ia apanhar das leitoras. Sou Toda Errada é um livro diferente porque a mocinha do livro é a vilã. Mas ao contrário da minha expectativa, as pessoas curtem o livro, e sabem me separar da malvada Mila. A repercussão foi a melhor possível. Recebi carinho com a publicação. O livro acabou me lançando definitivamente como escritora. Tem gente que nem sabe que eu sou atriz. E imagina, eu fui professora de teatro durante 12 anos, lecionei Interpretação com Texto em curso Profissionalizante de Artes Cênicas. Acho curioso porque Sou Toda Errada me apresentou de uma vez por todas para os leitores e curiosamente as pessoas próximas tinham medo da exposição, por causa do título do livro, mas eu não tive medo. Resolvi amar meu livro, mergulhar com ele e me arriscar. Se me tacassem pedra, eu sairia ainda mais forte. Mas ainda bem, o carinho foi maior e apagou qualquer crítica ruim, qualquer ataque capaz de me abater. As vendas continuam muito boas, dentro de todas as dificuldades que é não ter o livro em todas as livrarias. Para minha alegria, a edição está acabando. Aliás, me deixa agradecer aqui os leitores pelo carinho enorme, pelo suporte, pelas expectativas e palavras lindas. Tudo que faço hoje na minha carreira é pensando nessas pessoas.
Como você vê hoje o mercado para o novo escritor? Acha que há mais oportunidades? Acha que as pessoas estão lendo mais?
R: Acho que o planeta é lotado de gente e qualquer profissão é muito concorrida (rs), então é acreditar no seu taco. Eu costumo dizer que a concorrência não está no outro escritor. Pelo contrário. Leitor já descobriu meu livro porque leu o livro de um autor nacional, buscou outros autores e me achou. Quanto mais livros lidos, melhor. Eu faço parte do Novas Letras que é um grupo de escritores (O Novas Letras é formado por Enderson Rafael, Fernanda França, Leila Rego, Patrícia Barboza e a Tammy) e nos ajudamos, tentamos vencer as dificuldades juntos. Porque o mercado é difícil, o livro internacional é super valorizado, e nós escritores nacionais temos o desafio não só de valorizar a literatura mas exaltar o livro nacional. Vejo muita editora nova, oportunidades bonitas para quem está começando. É preciso procurar, se informar... Eu quero acreditar no nosso mercado, acreditando que podemos crescer ainda mais. Fico maravilhada com essa galera apaionada por livros, acompanhando cada detalhe das publicações, discutindo sobre capas, enredos, autores, mandando recados para as editoras. Acho o máximo! Aliás comento isso com meus amigos e eles me olham assustados. Muita gente não tem noção dessa turma que é louca por livros.


Que dicas você daria para quem está começando?
R: Escreva e leia muito. Leia seu texto para as pessoas, perceba se é isso mesmo que você quer para sua vida. Porque fotos em tardes de autógrafos são lindas, mas o trabalho não se resume ao glamour. É preciso se dedicar todos os dias, escrever mesmo sem vontade, dar o melhor de si e ter paciência. Vejo escritores que decidem escrever e querem publicar o livro por uma editora grande no mesmo ano. Eu escrevi dez anos antes do meu primeiro livro sair e breve fazem dez anos que meu primeiro livro saiu. São quase vinte anos nisso. Não é fácil. Escreva sem querer usar a literatura para se exibir. Acho que podemos fazer algo mais útil com a literatura dentro de nós. Claro que eu tenho orgulho do meu trabalho, às vezes preciso tratar o ego porque a gente é ser humano e tem dias que se deslumbra, mas no cotidiano eu tento usar a literatura para me redescobrir sempre, para confrontar meus questionamentos e definitivamente tentar ser alguém melhor.

Quais são seus próximos projetos? De quais eventos participará em breve?
R: Tem muita coisa boa acontecendo. Ontem estive na Exibição do filme "A Rua Daqueles Homens" (http://www.youtube.com/watch?v=wYHhl1gXCH8) que escrevi inicialmente como peça de teatro, mas acabou virando roteiro do filme graças ao Marcio Navarro (ator, diretor e amigo de anos) que leu o texto e pediu para trabalhar em cima. O filme acabou saindo com um elenco super querido (Alê Periard, Daiane dos Santos, Eduardo Maia e Marcio Navarro) e a direção do Décio Junior. É um fime feito sem muita grana, sem apoio, pelo total prazer de filmar. Porque estamos aí na batalha de fazer arte em um país em que muita gente não tem saneamento básico. Além do filme, continuo gravando minhas crônicas no Crônica Falada e tô lançando um projeto novo com minhas poesias em vídeo (os vídeos podem ser vistos no www.youtube.com/tammyluciano).  Em 2012, sai meu quarto livro Garota Replay (http://www.skoob.com.br/livro/160914-garota-replay). E tenho muita saudade do teatro, mas tá impossível fazer. Esse ano, viajo para autografar em Sampa, Curitiba, terei a honra de participar da Bienal de Pernambuco. A vida está corrida, mas estou muito feliz.

Fale um pouco sobre sua presença na Bienal do Livro do Rio de Janeiro. Onde seus leitores poderão encontrá-la?
R: Estarei todos os dias  da feira, 14 horas, no Estande da editora Novo Conceito, participando de um debate diário. Dia 09, 19 horas, autografo no estande da Saraiva. Tô muito animada para a Feira. Fiquei três meses me preparando. Pode parecer uma futilidade, mas eu desenhei um vestido para cada dia, porque quero estar linda para encontrar os leitores, quero dizer a eles como mudaram minha vida para sempre, para melhor. E o que pode parecer apenas uma exibição foi a maneira para demonstrar como esse evento que fala de livros, que nos coloca comemorando a literatura, é importante para mim e merece que eu vá lindona. Tô muito entusiasmada e pronta para ser muito feliz no evento.








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